sexta-feira, 2 de março de 2012

Perdido em mim mesmo

É mais uma madrugada de insônia nas trevas e no frio da própria casa iluminada e aquecida. Perdido, vago nu pelos cômodos em busca do outro eu. Aquele que imagino ser. Esbarrando entre dúvidas e móveis, sigo a angustiada jornada de procura tendo como único companheiro o cúmplice silêncio dos que dormem. O tato me serve de cão-guia. Mesmo com as extremidades dos dedos enrijecidas pelo gelo do tempo, reconheço os retratos nas paredes do escritório. As fotos familiares tentam me fornecer algum conforto. Tomada de lembranças efêmeras, a mente recorda os instantâneos feitos ao longo dos anos. Pareço ouvir as vozes daqueles momentos. O choro da filha ao nascer, o último adeus do pai doente, o irmão que ressente a distância, o amor pronunciado como um mantra pela esposa. Os sons querem indicar a provável resposta à incerteza de minha identidade, mas não possuem a força necessária para tanto. O esforço me extenua, e debilitado pelo frio, passo ao quarto onde um foco de calor me atrai. Como um farol, é ele que orienta agora meus passos até a cama na qual deito ao lado dela, a fonte da energia. Suspendo a busca e estendo a mão, antevendo a mão que já me espera acolhedora. Ela fecha-se sobre a minha e me conduz a um repouso pacífico de poucas horas. O vento lá fora uiva assustador ao dobrar a esquina. Aqui dentro, a dúvida persiste, adormecida por mais uma noite.


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